domingo, 6 de maio de 2012

Xadrez

"Cecilia, eu estou fazendo tudo errado!" Essa era a vontade de gritar que tanto atormentava Evaldo. E de fato havia muita coisa errada nisso tudo. Mais uma vez ele estava sendo egoísta, mais uma vez estava transformando tudo numa grande mentira. As conversas ficaram cada vez menores e mais constrangidas. Evaldo esperava que tudo fosse diferente, e se não fosse por ele mesmo, quem sabe teria sido. Ou não, ele acreditava que não cabia a ele decidir, e sim aceitar. Como num jogo de xadrez em que cada jogada sua cria inumeras situações para o adversário. Cada movimento errado, e tudo vai por água abaixo. Era assim que Evaldo se sentia; quantos movimentos errados ele fez. Agora era questão de esperar uma segunda chance, ou o xeque-mate.

Sem Fôlego

O Sol brilhava por entre as ruas do Centro Histórico de Curitiba, Evaldo estava dentro do ônibus a caminho do trabalho quando avistou, pela janela suja, uma moça num carro, que batia as cinzas de seu cigarro na rua e tragava mais uma vez o seu fumo de marca. A fumaça ia invadindo o pulmão dela assim como as frequências selecionadas entravam no ouvido pelo pequeno fone. Dava pra perceber que o homem no carro falava com ela, mas ela não escutava. E de repente, a vida simplesmente virou a esquina. O Sol, outrora tão brilhante, sumiu. E a moça de fones-de-ouvido e cigarro nunca mais apareceu. As pessoas deixam marcas, às vezes, e outros se vão, como a moça do cigarro e fones-de-ouvido. Evaldo chegou na escola em que trabalhava pra mais um daqueles dias metódicos e que se passavam numa velocidade assustadoramente lenta. Tentava, em vão ensinar algo àqueles poucos alunos que ainda se importavam. O dia acabou, e tristemente Evaldo ia pra casa, as fitas do walkman surrado já não tinham mais a mesma graça. Os bons cafés que tomava eram cada vez mais insossos. Não havia mais o calor que antes o motivava. Os problemas dele, e de outas pessoas o invadiam sem pedir licença, numa frequência que alarmava Evaldo. Pôs a chave na fechadura para mais uma daquelas noites em claro, à base de café e de vários textos ruins saindo pela máquina de escrever.

terça-feira, 1 de maio de 2012

Tempo

Evaldo pensava no tempo. Em toda uma dimensão, todo um fluxo e em todo esse louvor pelo tempo dos dias modernos. Pensava em como seria a vida se não houvesse a incerteza criada pelo tempo. Sentado, em meio aos seus rascunhos, Evaldo ia esboçando à lápis sua própria opinião do tempo. Sentindo o frio que ele sentia a medida que aquele mesmo tempo passava. Tão presente, tão constante, mas maleável ao mesmo tempo. Parecia até que era alguma ilusão criada por nós mesmos, pra representar justamente a passagem do tempo. Confuso... amassou e jogou longe. "Parece que para definí-lo tenho sempre que recorrer à alguma palavra que já carrega em si uma ideia pre-estabelecida do que é tempo." Tinha lido isso num artigo muito bom sobre justamente o tempo. Não sabia mesmo como definí-lo, era algo muito além da compreensão. Como diziam as músicas, "O tempo era um amigo precioso." Mas seria o tempo, algo subjetivo? Sim, somente pelo fato de que não podemos definí-lo. O problema reside em querer compará-lo com outras coisas. O tempo é mais que isso, ele é um sentido, assim como visão e audição, e ele serve para nós sentirmos o universo. Ele é algo muito superior a nós, ele é uma constante universal, mesmo que inconstante. Seria justo louvá-lo como um deus, pensou Evaldo, mas logo se lembrou que as pessoas já o louvam. Não havia por fim, nada de errado. Eram mais uma daquelas questões existencialistas que jamais iríamos encontrar respostas.