sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Conselho

Evaldo tinha uma palestra para dar na escola, um novo ano estava começando e com ele a volta às aulas que o atormentava. Naquele ano em especial Evaldo decidira mudar o seu discurso pragmático e sem graça para algo que talvez incentivasse seus alunos. Eis que o dia chegou, e Evaldo colocara alguns de seus rascunhos na maleta velha. No colégio, Evaldo estava sentando no seu lugar esperando, sem muitas esperanças a sua vez de se apresentar. Por fim o chamaram, ele levantou-se e seguiu até o palco do anfiteatro do colégio. Pela primeira vez naquele ano viu os olhos dos alunos olhando sem compromisso para ele. Alguns rostos repetidos, alguns novos.
"Olá, eu sou o Professor de Física, Evaldo. Por anos eu sempre disse a mesma coisa, mas por fim eu decidi mudar. Eu bem sei que muitos dos que estão aqui vieram sem escolha, e que devem estar querendo fugir. Eu sei porque eu fugi quando foi a minha vez. Mas por outro lado, tudo isso foi sempre uma obrigação para todos nós, e a diferença é que alguns de nós criam gosto pela obrigação. Esse foi o meu caso, e para que esse panorama geral mude, é preciso que esse seja o caso de vocês também."
Enquanto Evaldo dizia sobre o quão difícil era ser professor, mas ao mesmo tempo era reconfortante, ele imaginava o tamanho da sua própria hipocrisia. Nunca havia valido a pena, nunca foi reconfortante. Em meio  a todos aqueles poucos alunos que ainda olhavam para ele, Evaldo percebeu um rosto que se destacou. Era um aluno meio alto, parecia-lhe, cabelos longos bagunçados, de rosto fino e comprido, usava algumas pulseiras no pulso. Algo no olhar daquele garoto dizia que ele se importava, que ele parecia tomar as dores que Evaldo sentia, mas que não transparecia. Algo naquele garoto mostrava que ele entendia.
"Mas as coisas que nós pudemos fazer são mínimas, e cabem a vocês nos ajudarem, ou não."
Um dos alunos se levantou e perguntou:
- Você nos aconselharia a sermos professores?
Evaldo olhou para os seus colegas professores, olhou para a platéia, olhou para o garoto de pulseiras e disse em tom cansado.
- Não.

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